Fundamentos



6. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO*

Assumir a palavra é condição de cidadania. O domínio da linguagem, como atividade discursiva e cognitiva, é condição de maior participação social. Pela linguagem os indivíduos se comunicam, acessam à informação, defendem e partilham visões de mundo, produzem cultura.

A importância e o valor atribuídos aos usos da linguagem são determinados historicamente, de acordo com as demandas sociais de cada momento. Hoje, os níveis de leitura exigidos são bem diferentes dos que satisfizeram as demandas sociais há poucos anos. Autores como Magda Soares (2001), estudiosos dedicados à área do ensino da leitura e escrita, apontam para “a mudança na maneira de considerar o significado do acesso à leitura e à escrita em nosso país – da mera aquisição da ‘tecnologia’ do ler e do escrever à inserção nas práticas sociais de leitura e escrita”. O que significa dizer que não basta saber ler e escrever: é preciso fazer uso dessa tecnologia nas práticas sociais de leitura e escrita[1]. Portanto, é importante e necessário que se invista na formação de uma geração de leitores para um mundo em permanente mudança, cada vez mais exigente quanto à qualidade da leitura e da escrita.
Sendo assim, no contexto atual das sociedades e culturas mundializadas, a interação com as diversas linguagens não é apenas condição de comunicabilidade, mas também de apropriação de conhecimento e, por conseguinte, de desenvolvimento cognitivo; ganhando destaque, neste universo da comunicação, a linguagem falada e escrita.

Apesar de vivermos em um tempo de comunicação rápida, de profusão de imagens, de linguagens sintéticas, de novas formas de organização de mensagens verbais e não-verbais, o domínio da leitura e da escrita ainda se constitui em necessidade, talvez uma das mais importantes na formação do ser humano. É na e pela linguagem que o conhecimento acumulado pela humanidade se encontra registrado. Sendo assim, o domínio das formas de comunicação – oral e escrita – configura-se também como condição de exercício da cidadania, entendida, na perspectiva de Benevides (1994: 7), como “aquela que institui o cidadão como portador de direitos e deveres, mas essencialmente criador de direitos para abrir novos espaços de participação política”. Cabe à escola fornecer ao estudante os instrumentos necessários para que ele consiga buscar, selecionar, relacionar e organizar as informações complexas do mundo contemporâneo.

Seu papel, portanto, especialmente no ensino fundamental, é o de não apenas introduzir o estudante no mundo da escrita, mas de torná-lo letrado[2], ou seja, “um sujeito capaz de fazer uso da linguagem escrita para sua necessidade individual de crescer cognitivamente e para atender às várias demandas de uma sociedade que prestigia esse tipo de linguagem como um instrumento de comunicação” (KATO, 1987, p. 7).

Nesta perspectiva, para Lerner (2002, p. 17), “ler e escrever... palavras familiares para todos os educadores, palavras que marcaram e continuam marcando uma função essencial – talvez a única função – da escolaridade obrigatória”.

Para a autora, a escola, apesar de todas as dificuldades enfrentadas cotidianamente, tem a grande responsabilidade de

incorporar todos os alunos à cultura do escrito. [...] Participar da cultura escrita supõe apropriar-se de uma tradição de leitura e escrita; supõe assumir uma herança cultural que envolve o exercício de diversas operações com os textos e a colocação em ação de conhecimentos sobre as relações entre os textos, entre eles e seus autores, entre os próprios autores, entre os autores, os textos e seu contexto... (LERNER, 2002, p. 17).


A língua pode ser considerada como o principal instrumento de ensino e aprendizagem de todas as disciplinas, pois a quase totalidade das atividades tem como suporte o texto, quer enquanto objeto de leituras, quer enquanto trabalho de produção. Nas práticas em sala de aula, observa-se que os alunos leem textos relacionados às diferentes disciplinas do currículo para aprender seus conteúdos, sem que, de maneira geral, alguém lhes tenha ensinado como fazer isso. É comum à grande maioria dos professores pressupor que os alunos já saibam ler, pois já estão alfabetizados, bastando, portanto, que se apropriem dos conteúdos, tomando por princípio que os textos sejam autoexplicativos. Isto se deve, em grande parte, à formação inicial dos professores das diferentes áreas do conhecimento, excetuados os de Língua Portuguesa, que pouca ou nenhuma relevância dão aos aspectos relacionados ao ensino da língua.

A leitura do texto expositivo, por exemplo, um dos gêneros mais recorrentes nas disciplinas de História, Geografia e Ciências, praticamente não é ensinada, pois não é considerada por essas áreas como conteúdo de ensino.

Nossa tradição escolar, que certamente remonta ao modelo de ensinar calcado pelos jesuítas, no conhecido método de Ratio Studiorum[3], nos deixa como herança um ensino centrado em aulas expositivas, o que, certamente, não seria o mais adequado se pensarmos a sala de aula como espaço de formação de leitores e escritores. Além disso, a leitura de textos, quando é feita em sala de aula, normalmente é baseada em comandos gerais de compreensão do texto, como se este processo fosse algo intuitivo e espontâneo. Os procedimentos que envolvem a compreensão de textos são reduzidos a clichês - do tipo: “O que você achou do texto?”; “Qual a mensagem do autor?”; “Retire as informações principais.”; “Qual o assunto do texto?” -, aplicados a diferentes textos, sem que o professor perceba a necessidade e possibilidade de sistematização dos processos que envolvem o ato de ler, ou que justamente as especificidades de cada texto, os gêneros[4], requerem estratégias diferenciadas para seu entendimento e, por conseguinte, para o entendimento do conteúdo que desejam ensinar.

Neste processo, o professor, muitas vezes, acaba desconsiderando o fato de que uma leitura implica mobilizar conhecimentos prévios, retroceder para avançar, reconhecer códigos e imagens, criar hipóteses, refutar ou confirmar antecipações, levantar dados, associar informações presentes em diferentes pontos do texto, estabelecer relações, contextualizar, produzir deduções e inferências, desvelar aquilo que está implícito, posicionar-se, reelaborar e/ou reordenar o que foi lido.

Outro aspecto fundamental, que nos parece secundarizado em muitas práticas pedagógicas envolvendo o ensino da leitura, diz respeito à clareza de seus objetivos. Para Isabel Solé,

sempre deve existir um objetivo para guiar a leitura. (...) O leque de objetivos e finalidades que faz com que o leitor se situe perante um texto é amplo e variado: devanear, preencher um momento de lazer e desfrutar; procurar uma informação concreta; seguir uma pauta ou instruções para realizar determinada atividade (...); informar-se sobre um determinado fato (...); confirmar ou refutar um conhecimento prévio; (...). Uma nova implicação derivada da anterior é que a interpretação que nós leitores, realizamos dos textos que lemos depende em grande parte do objetivo da nossa leitura. Isto é, ainda que o conteúdo de um texto permaneça invariável, é possível que dois leitores com finalidades diferentes extraiam informação distinta do mesmo. Assim, os objetivos da leitura são elementos que devem ser levados em conta quando se trata de ensinar as crianças a ler e a compreender (SOLÉ, 1998, p. 22).

Estudar o tema da leitura implica destacar questões como: o que é ler, para que ler, como ensinar a ler e a quem compete essa tarefa. As respostas a essas questões orientam nossa concepção de ensino.

Quando falamos em leitura tomamos como referência a concepção bakhtiniana, que considera a leitura como uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de saberes. Essa concepção põe em foco o leitor e seus conhecimentos em interação com o autor e o texto para a construção do sentido. Nessa perspectiva o leitor, como sujeito ativo na construção do sentido do texto, lança mão de uma série de estratégias como seleção, formulação de hipóteses, inferências, verificação, por meio das quais realiza o processamento do texto. Para Mikhail Bakhtin,

toda compreensão da fala viva, do enunciado vivo é de natureza ativamente responsiva (embora o grau desse ativismo seja bastante diverso); toda compreensão é prenhe de resposta, e nessa ou naquela forma a gera obrigatoriamente: o ouvinte se torna falante (BAKHTIN, 1997, p.271).

Assim, pensar a leitura e a escrita como atividades interativas indica que nossas concepções sobre os objetos e métodos de ensino precisam ser revistas, no sentido de implementar uma outra prática pedagógica capaz de atribuir sentido aos processos de ensinar e aprender como atividade essencialmente humana.

Posto que a realização dos propósitos educativos depende invariavelmente de um grau importante do domínio do código linguístico escrito e do desenvolvimento dos processos mentais que se encontram em sua base, acreditamos não ser possível pensar em mudanças no ensino da leitura e da escrita sem estender tal problemática a todas as áreas do conhecimento, em uma perspectiva interdisciplinar. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) fazem referência a essa perspectiva:

A língua, sistema de representação do mundo, está presente em todas as áreas do conhecimento. A tarefa de formar leitores e usuários competentes da escrita não se restringe, portanto, à área de Língua Portuguesa, já que todo professor depende da linguagem para desenvolver os aspectos conceituais de sua disciplina (BRASIL, 1998, p. 31).

Nesse contexto, a idéia de que expressar-se com propriedade é “coisa para a aula de língua portuguesa”, enquanto as demais disciplinas se preocupam com os “conteúdos específicos”, não se sustenta. Sendo a língua o principal instrumento de ensino e de aprendizagem na escola, a tarefa de formar leitores e usuários competentes da escrita não pode estar restrita à disciplina de Língua Portuguesa, já que todo professor depende da linguagem para desenvolver os aspectos conceituais de sua disciplina. Pela linguagem, os indivíduos se comunicam, acessam as informações, defendem e partilham visões de mundo, produzem cultura.

Disto decorre que um programa de formação de professores passa necessariamente por sua formação como utilizadores proficientes da língua, devendo-se, ao mesmo tempo, propiciar a eles os meios necessários à apropriação de saberes que conduzam a uma inovação didática. É preciso exercitar uma nova didática que cumpra a função primordial da escola, que é a de favorecer a autonomia e a descoberta de ser leitor nas múltiplas faces da língua, nas diversas disciplinas que compõem o currículo escolar. É fundamental inserir todos os grupos sociais nas práticas de uso da leitura e da escrita, a fim de que se tornem usuários e críticos dessas práticas. E esta não é apenas uma opção técnica em busca da competência contra o fracasso na escola; é, sobretudo, uma opção política pela formação/inclusão de todos.

Uma formação de professores praticantes de leitura e escrita, capazes de evidenciar perante as crianças o comportamento leitor e escrevente, é uma das condições para mudarmos os preocupantes indicadores de desempenho escolar, pois a ninguém é dado o “dom” de ensinar aquilo que não sabe.

Diante desse desafio, a Escola Básica Municipal Beatriz de Souza Brito, pertencente à Rede Municipal de Ensino de Florianópolis, vem desenvolvendo, há quase uma década, o curso de formação continuada “Ler e escrever: compromisso da escola, compromisso de todas as áreas”, envolvendo os professores de todas as séries/anos e de todas as disciplinas do ensino fundamental.

Os estudos e debates realizados ao longo deste processo de formação continuada em torno do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita foram se constituindo como referencial teórico e metodológico para a discussão e elaboração da proposta pedagógica da Escola.

A partir desse referencial teórico e dessa experiência sobre os limites e as possibilidades das novas práticas pedagógicas gestadas ao longo desses anos, é que a Escola tem focado suas discussões sobre o currículo. Superar a visão pautada na crença de que aos anos iniciais cabe ensinar a ler e escrever e aos anos finais, os conteúdos específicos, é defender a apropriação da leitura e da escrita nas suas dimensões histórica e cultural para todas as áreas do currículo escolar. Este tem sido um grande desafio para o coletivo desta Escola.

6.1 Formação Continuada

Desde 2004, o tempo destinado as reuniões pedagógicas no calendário da Escola Beatriz é utilizado para a implementação do Curso de Formação “Ler e escrever: compromisso da escola, compromisso de todas as áreas”. O Curso é constituído de dois módulos: um de Língua Portuguesa, destinado a todos os professores do 1º ano a 8ª série e um, de Matemática, destinado prioritariamente aos professores dos anos iniciais. O módulo de Língua Portuguesa é ministrado pela Professora Terezinha Costa Hashimoto Bertin e o de Matemática pela Professora Regina Célia Santiago, ambas consultoras da Editora Ática.

Tanto o módulo de Língua Portuguesa quanto o de Matemática são organizados em duas etapas: dois dias no primeiro semestre letivo e dois dias no segundo semestre, totalizando 50 horas de formação por ano para cada módulo. Dessas, 32 horas são presenciais e 18 horas não presenciais, sendo destinadas a leitura/estudo dos participantes e a implementação de práticas pedagógicas inovadoras. Na segunda etapa do Curso, os professores apresentam sequências didáticas que tenham sido desenvolvidas com uma ou mais turmas e que tenham relação com a temática discutida naquele ano. A análise dessa apresentação se constitui em um importante momento de reflexão e de avaliação do próprio processo de formação do professor e do grupo.

Módulo de Língua Portuguesa

De 2004 a 2008, os professores dos anos iniciais e finais participavam do mesmo processo de formação, pois era preciso consolidar a concepção de que a formação de leitores e usuários competentes da escrita é uma tarefa de todos e não apenas do professor de Língua Portuguesa.

Conteúdos trabalhados ao longo desse período: níveis de leitura ou etapas de apropriação de um texto verbal ou não verbal: compreensão imediata, interpretação e extrapolação; definição de gênero e as implicações pedagógicas no trabalho com gêneros do discurso; esfera de comunicação: tema, intenção, circunstância comunicativa, contexto, gênero e escolhas linguísticas; proposta de agrupamentos de gêneros orais e escritos de Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz: narrar, relatar, argumentar, expor e instruir; estratégias de leitura adequadas aos gêneros; a mediação do professor como uma intervenção planejada e qualificada; a leitura como construção de sentido; fatores de compreensão da leitura; a leitura como metacompetência e objeto de ensino de todas as áreas do conhecimento; concepção de currículo; eixos articuladores do currículo; o conteúdo curricular nas três dimensões: conceitual, procedimental e atitudinal (César Coll); o papel dos gêneros na formação do leitor proficiente; definição de uma proposta de gêneros textuais: um desafio para a Escola Beatriz; a leitura como um dos eixos de articulação do currículo.
   
De 2009 a 2012, para dar conta da especificidade dos anos iniciais e dos anos finais – uma necessidade que surgiu durante o próprio processo de formação – o Curso foi separado em dois momentos: um destinado aos professores dos anos iniciais e um aos professores dos anos finais.

Conteúdos trabalhados nos anos iniciais: concepção e ensino da língua; alfabetização e letramento; apropriação do sistema de escrita alfabético; eixos necessários à aquisição da língua escrita: compreensão e valorização da cultura escrita, apropriação do sistema de escrita, leitura, produção de textos escritos, desenvolvimento da oralidade (pró-letramento); conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais: primeiras aproximações; as habilidades de leitura exigidas na Prova Brasil de Língua Portuguesa de 4ª série/5º ano: conhecendo os descritores; alfabetizar letrando: um desafio para os anos iniciais; domínio da base alfabética; ortografia: dedução de regras a partir da compreensão das regularidades da escrita; momentos da narrativa: situação inicial, conflito ou complicação, clímax do conflito, desfecho; elementos da narrativa: personagens, tempo, espaço, ação ou enredo; condições de produção de um texto: o quê, por quê, para quê, para quem, com que intenção, em qual circunstância, onde circulará o texto, que escolhas de linguagem; aspectos lingüísticos do texto: convenções da escrita, uso da letra maiúscula, uso do parágrafo, pontuação final e intermediária, uso do tempo verbal, elementos de coesão.

Conteúdos trabalhados nos anos finais: conteúdos conceituais: fatos e conceitos; a aprendizagem, o ensino e a avaliação de fatos e conceitos; aprendizagem memorística e aprendizagem significativa; a importância da mobilização dos conhecimentos prévios para a aprendizagem significativa; a necessidade de sequências didáticas para o ensino dos conteúdos; eixos articuladores do currículo; conteúdos conceituais e procedimentais: uma articulação necessária; os conteúdos procedimentais específicos às diferentes áreas do conhecimento; conteúdos procedimentais comuns a todas as áreas; procedimentos comuns de leitura e produção escrita: resumo e mapa conceitual; aprender a ler e ler para aprender; a leitura como conteúdo de ensino em todas as áreas do conhecimento; a importância dos objetivos da leitura; os textos do livro didático e os objetivos da leitura: uma articulação necessária; a leitura compartilhada; momentos da sequência didática: antecipação/mobilização de conhecimentos prévios, problematização, construção, sistematização, consolidação e avaliação.

Módulo de Matemática

Conteúdos trabalhados ao longo desse período: o sistema de numeração decimal: um pouco da história; conceitos matemáticos fundamentais para o ensino nas séries iniciais; formulação e resolução de problemas; a importância do trabalho com  estatística, probabilidade, possibilidade, estimativas, arredondamentos e cálculo mental; a avaliação em matemática; a linguagem matemática como comunicação; o valor da decomposição no processo de compreensão do sistema de numeração decimal; por que trabalhar com algoritmo não convencional nas séries iniciais?; a importância do cálculo mental; o que significa ser numeralizado; espaço e forma: a importância da geometria no aprendizado da matemática; números fracionários e decimais – idéia de porcentagem; a importância da percepção geométrica no aprendizado do ler e escrever; o campo conceitual do pensamento geométrico: espaço, forma, grandezas e medidas; os principais conceitos a serem abordados no eixo de conteúdo – grandezas e medidas: a grandeza a ser medida, o instrumento de medida, a unidade de medida; interpretação e resolução de situações-problema envolvendo os quatro eixos de conteúdo; análise das questões da Prova Floripa de Matemática – 2007; o sistema de numeração: base dez e valor posicional; análise das notações espontâneas da criança no processo de apropriação do sistema de numeração; a complexidade do processo de apropriação dos números escritos; as vírgulas e pontos nos números; as notações de frações no contexto de problemas algébricos; figuras geométricas bidimensionais e tridimensionais: semelhanças e diferenças; principais poliedros: prismas e pirâmides; elementos de um poliedro: vértices, faces e arestas; planificações dos sólidos geométricos; localização e movimentação de um objeto no espaço; ampliação e redução de figuras planas pelo uso de malha quadriculada;  diferentes formas de resolver problemas; problemas e contas: dois desafios diferentes; a resolução de problemas; a teoria das situações didáticas; os campos conceituais de Gerard Vergnaud; características do sistema de numeração decimal; a importância da decomposição no processo de compreensão do sistema de numeração decimal; formular e resolver problemas: uma prática pedagógica fundamental; diferentes estratégias de resolução de problemas.

A cada ano de formação é produzido um relatório final contendo: projeto, descrição das atividades realizadas, fotos do curso, ata das duas etapas, avaliação dos participantes, lista de presença e documentação necessária para emissão dos certificados. O processo de elaboração das atas é extremamente moroso, pois envolve um trabalho inicial, feito por profissional da própria Escola, de transcrição das filmagens do Curso. As atas elaboradas são impressas e entregues a todos os cursistas. Essa é uma das formas encontrada pela Escola de materializar as discussões e os estudos realizados e, ao mesmo tempo, de garantir que os professores contratados em caráter temporário acompanhem o processo de formação.
O Curso é filmado pela Escola e o material audiovisual encontra-se disponível para consulta dos professores.

Os recursos financeiros necessários para a viabilização desse Projeto são disponibilizados pela Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis, pela Editora Ática e pela Associação de Pais e Professores da Escola Beatriz.

7. ORGANIZAÇÃO CURRICULAR

A trajetória de formação desenvolvida na Escola Beatriz, desde 2004, embora encontre na rotatividade dos professores um obstáculo permanente, nos permite afirmar que a concepção de que o ensino da leitura e da escrita é um compromisso de todas as áreas do conhecimento está consolidada em nosso projeto político-pedagógico.

A partir dessa premissa foi possível a definição de eixos de articulação do nosso currículo e de conteúdos procedimentais comuns a todas as áreas do conhecimento.

Eixos de articulação do currículo
Interdisciplinaridade
Leitura e escrita como compromisso de todas as áreas
Compromisso com o letramento
Contextualização dos conteúdos das diversas áreas de ensino
Leitura de textos em linguagem verbal e não-verbal: domínio de formas, códigos e convenções dos diversos sistemas de representação
Leitura como conteúdo de ensino:
sistematização de processos e estratégias de leitura;
sistematização de níveis de proficiência em leitura (compreensão imediata, interpretação e extrapolação).
Formulação de estratégias de leitura para a compreensão de textos específicos das áreas de estudo, envolvendo:
dedução de significados a partir do contexto;
seleção de informações relevantes.
Acesso a informações relativas à área do conhecimento de cada disciplina;
Ordenação e sistematização de conhecimentos e informações:
transpor da oralidade para a escrita;
registrar o que foi estudado ou observado;
anotar termos-chave a partir de algo ouvido, lido ou assistido.

Conteúdos procedimentais comuns a todas as áreas
Ler e interpretar textos verbais e não-verbais:
localizar informações e levantar dados do texto;
fazer inferências a partir dos dados do texto;
contextualizar as informações do texto;
estabelecer relações entre as informações do texto;
intertextualidade: estabelecer relações entre o texto e outros textos;
extrapolar sentidos em relação ao texto lido;
deduzir sentidos de termos ou palavras do texto;
identificar, reconhecer ou perceber os efeitos de sentido produzidos pelas escolhas de linguagem.
Produzir textos verbais e não-verbais em todas as áreas
Reelaborar ou reescrever textos para aperfeiçoá-los e/ou adequá-los aos seus propósitos
Perceber-se, situar-se em relação a um espaço e tempo
Desenvolver mecanismos de organização e apropriação de conhecimento: selecionar relevâncias; identificar fatos, dados, conceitos; sintetizar; resumir; construir esquemas, mapas conceituais, formas de representar o conteúdo estudado
Utilizar instrumentos de observação e medida
Estabelecer relações entre teoria e prática
Apresentar oralmente textos formais
Produzir inferências e conclusões a partir de regularidades observadas
Saber buscar, selecionar e registrar informações para uma pesquisa
Ordenar fatos, dados, observações
Representar em linguagem verbal e não-verbal fatos e dados
Estabelecer relações contextuais entre o objeto estudado e outros dados
Comparar para estabelecer semelhanças e diferenças
Propor e aplicar estratégias para a resolução de problemas
Posicionar-se frente a fatos, dados, ideias e construir argumentação para sustentar a posição assumida

Neste sentido, o desafio posto para a Escola Beatriz, desde 2011, tem sido a sistematização e a construção de um currículo que de fato expresse o compromisso de todas as áreas do conhecimento com a leitura e a escrita. Esse desafio está expresso nas metas definidas pela Escola para a atual gestão 2011/2013, quais sejam: ** professores de todas as disciplinas envolvidos com a tarefa de formar leitores e usuários competentes da escrita; ** currículo da Escola Beatriz definido em torno do eixo – ler e escrever: compromisso da escola, compromisso de todas as áreas; ** espaço escolar reestruturado em função do currículo.


[1]De acordo com Magda Soares “a alfabetização é um componente do letramento, mas é preciso distinguir claramente o que é alfabetização – a aquisição do sistema de escrita, a aquisição da tecnologia da escrita – do que é letramento – o uso dessa tecnologia, o exercício das práticas sociais de leitura e de escrita. (...) Usando um verbo que ainda não está dicionarizado, eu diria que devemos alfabetizar letrando: ensinar a ler e a escrever por meio de práticas sociais reais de leitura e de escrita.” (SOARES, 2004, p. 7)

[2]“Com o surgimento dos termos letramentoe alfabetização (ou alfabetismo) funcional, muitos pesquisadores passaram a preferir distinguir alfabetização e letramento. Passaram a utilizar o termo alfabetização em seu sentido restrito, para designar o aprendizado inicial da leitura e da escrita, da natureza e do funcionamento do sistema de escrita. Passaram, correspondentemente, a reservar os termos letramento ou, em alguns casos, alfabetismo funcional, para designar os usos (e as competências de uso) da língua escrita.” (Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008. Pró-letramento: Programa de Formação Continuada de Professores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental: alfabetização e linguagem. Brasília – DF, p. 10).
[3] Ver a este respeito: CHATEAU, Jean. La Pedagogia de los Jesuítas. México, Fundo Econômico de Cultura, 1992.

[4]“Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua. Não é de surpreender que o caráter e os modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas da atividade humana, o que não contradiz a unidade nacional de uma língua. A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais –, mas também, e sobretudo, por sua construção composicional. Esses três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso.” (BAKHTIN, 1997, p. 279)

.............................................

* Do Projeto Político-Pedagógico da Escola (Em discussão).

Nenhum comentário:

Postar um comentário